Os relógios circadianos ajudam os organismos a antecipar e reagir às mudanças ambientais diárias, como luz e temperatura. Nas plantas, esses relógios controlam processos vitais como fotossíntese, floração e respostas ao estresse. Quando as temperaturas aumentam, um relógio que funciona bem pode ajudar as plantas a ajustar sua fisiologia para evitar o superaquecimento, conservar água ou otimizar o uso de nutrientes. Pesquisa recente publicada em New Phytologist sobre duas espécies de árvores das florestas da Patagônia forneceu insights sobre como esses relógios podem influenciar a sobrevivência das árvores e crescimento em um clima mais quente.
As árvores usam seus relógios circadianos, que são precisamente regulados por sinais que transmitem informações sobre o tempo externo, como o ciclo natural do dia e da noite, para reconhecer mudanças diárias e sazonais e ajustar funções vitais. Esse arrastamento diário por sinais cíclicos atua como um sinal confiável para manter o relógio no caminho certo. Mesmo quando exposto a diferentes temperaturas em uma ampla faixa térmica, o sistema circadiano permanece sincronizado e funcional. No entanto, quando exposto a temperaturas fora dessa faixa térmica, o relógio falha, e as árvores podem perder vantagens para crescer no ambiente natural, e isso pode reduzir sua produtividade.

O estudo se concentrou em duas espécies intimamente relacionadas de Nothofagus, um gênero de árvores encontradas nas florestas da Patagônia, na América do Sul. Essas espécies ofereceram uma oportunidade única de explorar a adaptação às mudanças de temperatura, já que se vive em ambientes mais frios e de alta altitude (Nothofagus pumilio), enquanto o outro habita regiões mais quentes e de baixa altitude (Nothofagus oblíqua).
Combinando bioinformática, biologia molecular e ecofisiologia, a pesquisa liderada por Maximiliano Estravis-Barcala e Verónica Arana abordou como o aumento das temperaturas afeta os relógios circadianos dessas espécies. No laboratório, eles analisaram mudanças na expressão genética (como os genes ligam e desligam) em resposta a temperaturas mais altas. Usando a montanha como um laboratório natural, eles realizaram experimentos de “troca de altitude”, plantando mudas de cada espécie em seus ambientes nativos e não nativos. Essa abordagem permitiu que eles abordassem o quão bem os relógios circadianos das árvores e o desempenho geral se saíram em condições mais quentes ou mais frias.
Os resultados revelaram diferenças interessantes entre as duas espécies. Nothofagus pumilio, o adaptado ao frio, teve problemas quando exposto a temperaturas mais altas. Enquanto o relógio funcionava normalmente a 20°C, temperaturas quentes de 34°C causaram uma quebra na expressão rítmica de genes-chave. Essa interrupção se estendeu à regulação de processos sensíveis ao tempo, com muitos genes perdendo seu padrão dia-noite e mudando para respostas ao estresse. Experimentos de troca de altitude mostraram que N. pumílio, teve dificuldades em sincronizar seus ritmos circadianos em ambientes mais quentes e de baixa altitude, o que levou à interrupção dos padrões de expressão genética e à redução do crescimento e da sobrevivência.

Em contraste, N. obliqua, nativa de habitats mais quentes, manteve uma função de relógio robusta e teve um bom desempenho em todas as altitudes. Seu relógio circadiano permaneceu estável, mesmo em condições mais quentes, permitindo que ele mantivesse as taxas de crescimento e sobrevivência. No geral, isso sugere que diferenças interespecíficas na influência da temperatura no desempenho do relógio circadiano estão associadas à plasticidade térmica de mudas em ambientes naturais.
Nossas descobertas, de que mudas de N. pumílio (espécies de alta altitude que habitam ambientes mais frios) tinham função oscilatória limitada em zonas mais quentes (baixa altitude) da floresta, e a sobrevivência e o crescimento reduzidos são novas evidências que ligam a interrupção da função oscilatória à baixa tolerância a temperaturas mais altas no ambiente natural. Em contraste, mudas de N. obliqua (espécies de baixa altitude que habitam ambientes mais quentes) foram capazes de manter ritmos em temperaturas mais altas do que N. pumílio, e eles mostraram sobrevivência e mortalidade semelhantes em ambos os ambientes do experimento de mudança de temperatura/altitude, consistente com o fato de que N. obliqua as mudas apresentaram osciladores sincronizados em ambos os ambientes.
Estas descobertas destacam as implicações significativas das alterações climáticas nos ecossistemas florestais, enfatizando a vulnerabilidade de espécies adaptadas ao frio, como N. pumílio. À medida que o planeta esquenta, interrupções na sincronização circadiana podem perturbar o equilíbrio fisiológico e ecológico dessas espécies, limitando o crescimento e a sobrevivência. Entender como os ritmos internos são afetados pelo aumento das temperaturas é crucial para prever e mitigar as consequências mais amplas para as plantas e os ecossistemas que elas sustentam, enfatizando a necessidade urgente de estratégias adaptativas para proteger esses ambientes delicados.
LEIA O ARTIGO
Estravis-Barcala M., Gaishuk S., González-Polo M., Martinez Meier A., Gutiérrez R.A., Yanovsky M.J., Bellora N. and Arana M. V. (2024) “Effect of temperature on circadian clock functioning of trees in the context of global warming” New Phytologist. Available at: https://doi.org/10.1111/nph.20342
Nothofagus pumilio na Patagônia Chilena, perto de Punta Arenas. Foto: canva.
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